quinta-feira, 12 de março de 2009

Vistos para Angola: Três meses de exílio

José Eduardo dos Santos, Presidente de Angola e José Sócrates, Primeiro-Mininstro Português - foto retirada do amadeo.blog

José Eduardo dos Santos e Aníbal Cavaco, Presidente de Portugal - foto retirada de TSF Radio

Há mais de três meses que não actualizava o blog. Primeiro, por causa do cansaço extremo e da pressão que se exerceu sobre nós no último mês de estada em Angola face às exigências do trabalho que desenvolvíamos; depois porque me saturei da morosidade da internet na colocação de fotografias que antes tinha que seleccionar e reduzir, postar uma a uma, por vezes repetir a postagem porque não era bem sucedida nem à primeira nem à segunda…e já me bastavam outras dificuldades para ainda dedicar alguma paciência exaurida a estas. Em segundo lugar, porque regressei a Portugal para aquilo que eu pensava serem apenas as férias de Natal e afinal a estada tornou-se num «exílio» de três meses em virtude da burocracia consular e da entropia institucional na emissão e envio da papelada necessária para os processos de Visto. Documentos sucessivamente caducos no prazo e na forma: devem endereçar-se à Missão Consular de Angola e não ao Consulado de Angola, como era uso ainda há um mês; pedem-nos novos papéis que antes não eram exigidos, como os certificados e diplomas desde que começámos a estudar – da escola primária aos pós-doutoramentos….vá lá que da creche não se lembram. As alterações e os novos requisitos implicam que os documentos já reunidos se encontrem entretanto datados, como o registo criminal - que tive que solicitar por três vezes, porque o segundo se extraviou na agência que nos trata destas situações – e os contratos de trabalho (e os de promessa também) que tiveram que ser actualizados, enviados de Angola por email para todos nós, assinados por nós, enviados para Luanda, assinados pelo contratador, colocados no correio do aeroporto angolano para o de Lisboa e…durante três dias ninguém soube onde estava o pacote que incluía o alvará da empresa, o Relatório de Contas, novas cartas de chamada, etc….
Agora sim. Amanhã seguem para a empresa subcontratada pela agência para gerir o processo de pedidos de Vistos – Ordinário e de Trabalho – com contactos pessoais com a Embaixada de Angola em Lisboa e com o Consulado de Angola no Porto, porque sem «conhecimentos», nada neste mundo diplomático, neste contexto, funciona e avança.
Vá lá, vá lá….não tenho que ir dormir ao relento para a porta da embaixada em Alcântara – Lisboa, como muitos outros fazem, sem saber ao certo se conseguimos apanhar uma das três senhas para: validar o passaporte, pedir o VO, pedir o VT. E, não conseguindo, que é o mais provável, ser forçada a negociar com algum agiota, melhor dizer, um bizzneiro (de business – negócio – o pior insulto endereçado a alguém na cultura angolana) uma única senha por, pelo menos, 500 euros. Inacreditável.
Portugal acolhe esta semana o Presidente de Angola, José Eduardo dos Santos, que fica muito bem na fotografia. As notícias proliferam: sobre o aprofundar de relações comerciais luso-angolanas; acerca da criação de um banco comercial misto composto pela Caixa Geral de Depósitos portuguesa e a Sonangol petrolífera angolanas; versando um crédito para investimento em exportações e outros negócios; promovendo a simplificação da concessão de vistos…
Certo e sabido que é a nível diplomático que os Estados plasmam os seus conflitos e ressentimentos e que qualquer aumento de exigência absurda reflecte o comezinho de alguma vingança pelas desilusões provocadas mutuamente.
Disseram-me que o Governo Português exige aos angolanos certificados de conclusão do ensino primário, talvez por causa de eventuais falsificações de diplomas de que foram acusados alguns cidadãos desse país. O que os penaliza pois é difícil conseguir tais documentos quando a escola onde estudaram já não existe porque foi bombardeada na guerra. E, que por isso, o consulado começou também a pedi-los aos tugas.
Tudo isto atrasa, adia, cristaliza….E, psicologicamente, a mim, mergulha-me numa apatia, numa neurastenia….numas brumas….A dissipar até ao final de Março, espero!
Links de interesse:



Jornais:





















quarta-feira, 11 de março de 2009

Prémio DARDOS


Surpresa!

Alguém me lê, além da família e amigos mais próximos. Alguém me ama...
Fui premiada pela Blogosfera. O meu estimado, e sempre acompanhado nas aventuras por Angola, Congo e outras paragens no mundo que ele percorra, Diário da Africa, homenageou o meu Diadema de Angola. Logo a seguir, outro companheiro de narrativas, o Em Angola, com quem me delicio pela prosa sensorial, também me agraciou.
Pulei, gabei-me, pus-me em bicos de pés porque deles recebi o Prémio Dardos. Já não estou tão só como me imaginava. Ainda bem. Afinal, somos todos a plateia uns dos outros e vivemos a vida uns dos outros pelos relatos emotivos e impressivos que partilhamos. Sobretudo, quando estamos longe do país em que habitualmente vivemos, os amigos da blogosfera são algumas das nossas âncoras nesta nossa deriva no Planeta. Para mim, são um ponto de fixação na latitude e longitude de uma viagem de transição geográfica, espiritual e afectiva.
Explicando o Prémio Dardos:

«Com o Prémio Dardos reconhecem-se os valores que cada blogger, emprega ao transmitir valores culturais, éticos, literários, pessoais, etc. que, em suma, demonstram sua criatividade através do pensamento vivo que está e permanece intacto entre suas letras, entre suas palavras. Esses selos foram criados com a intenção de promover a confraternização entre os bloggers, uma forma de demonstrar carinho e reconhecimento por um trabalho que agregue valor à Web. Este prémio obedece a algumas regras:

1) Exibir a imagem do selo;

2) Linkar o blog pelo qual se recebeu a indicação;

3) Escolher outros blogs a quem entregar o Prémio Dardos.»

Assim sendo, retribuo o prémio a quem me honrou com ele e indico ainda os seguintes blogs:

Posteriormente, linkarei todos os blogs que ainda não se encontram inseridos aqui, bem como comunicarei com os seus autores. Vai ser um prazer alargar a rede.




terça-feira, 11 de novembro de 2008

Chela e Nossa Senhora do Monte: Água de Beber e de Nadar
































Bebemos água da serra da Chela. Água onde beberam os bois é que não. É assim que os habitantes do Lubango se queixam sobre as condições sanitárias deficientes na cidade. É sempre o mesmo argumento: a urbe cresceu desproporcionada. A população aumentou, as redes de saneamento básico são as mesmas que os portugueses deixaram aptas para uma densidade de 60.000 habitantes enquanto hoje partilham o mesmo espaço e ar 1.078.215 habitantes numa extensão de mais de 79 mil quilómetros quadrados. (vide http://www.mat.gv.ao/portal mat/ ).
Se compararmos a cidade dos anos 60 e 70 com a cidade do séc.XXI poderemos ver as diferenças. Consultem os blogues http://www.pessoalissima.com/Terra/Lubango/Lubango.html e http://angolalubango.com.sapo.pt/fotos_sabandeira.html ou o blog http://www.sanzalangola.com/galeria/album09 com um espólio iconográfico valioso, que inclui arquivo do arquitecto Ludovice (o riscador de muitos monumentos por aqui ) e um repositório emocional saudosista profundo.
Verificamos o crescimento das casas de adobe e zinco, com o telhado seguro por pedras, sustentadas pelos regatos e poços artesanais e cisternas de manivela municipais. Já não nos orientamos apenas pelas quatro ruas principais hoje escortanhadas por ruas secundárias e com a simetria arruinada pela construção popular que nasceu por onde der. Já não existe o eucaliptal com corvos a grasnar por trás do prédio da Acajobel de que me falou uma querida amiga.
Já não existe a rua do Picadeiro por onde as pessoas passeavam ao fim da tarde em convívio. Hoje chama-se Avenida Hoji Ya Henda, mas ainda por aqui continuam a deambular as pessoas, a cruzarem-se, a comprar o abacaxi ou o cogumelo gigante na vendedora de bacia, a ir tomar o café nas pastelarias ou a saborear o sorvete nas gelatarias ou a ir buscar o pão fabuloso – de miolo cheio e côdea estaladiça e macia que se saboreia na alvorada e ao entardecer ainda quentinho com manteiga a derreter. A aquecer as mãos nas «noites frias da Huíla».
A cidade tem vida, esmorecendo a partir das 9h da noite porque não há iluminação pública espalhada por todas as zonas. Poucas casas comerciais continuam abertas depois dessa hora, com excepção de alguns restaurantes e bares. Destes, o mais conhecido é o Kopus Bar cuja entrada é de 1.500 Kz, mas quase sempre só o homem é que paga. Só aqui digo: «Viva o machismo»!
Também já não existe a fonte luminosa mas ainda lá está, e operacional, a Sé e a praça arranjadinha. Aliás, é o único sítio onde se mantém sempre funcional a iluminação pública. É o centro da cidade e onde se situam os edifícios governamentais e institucionais. Convém, não é?
Ainda existe a piscina da Nossa Senhora do Monte, mas não está operacional. Encontra-se em reabilitação, dizem. Pelas fotos do Antigamente lastima-se que não esteja já pronta e disponível, pois se tratava de um espaço de recreio muito apreciado por todas as famílias de Lubango e arredores. Abastecida com água puríssima da serra da Chela, sempre renovada, bordejada por flores e árvores floridas, tapete de relva e arbustos, prancha e trampolim para saltos. Lindo! Ainda hoje nos enche a vista, mais a memória é certo, por vislumbrarmos o que ainda pode voltar a ser.
Nós queremos ir lá espairecer! Ouça-nos a todos senhor novo autarca do Lubango. Devolva-nos esse prazer, esse lugar lúdico e hedónico. Precisamos de descansar alma, espírito e corpo na doce água da Chela de Ph 5,6. A entrada custa menos que a do Grande Hotel ou do Casper’s.


















sexta-feira, 7 de novembro de 2008

Frutos do Mato: Noncha








Já provei mais um fruto tropical! Chama-se Noncha e pouca gente aqui o aprecia. Ovalado, com uma pele fina amarelada que se rompe para mostrar a polpa da mesma cor. Não se pode trincar, só chupar e debruçado porque é sumarento como a manga e, se não tivermos cuidado, ficamos com nódoas.
A polpa, que arranhamos com os dentes e sugamos com a língua, depois de perder o sumo perante o ataque, ganha uma consistência parecida com uma esponja seca e aveludada. O caroço nem se vê coberto por essa pelagem, e é grosso.
Tive sorte: a minha primeira experiência com a Noncha foi agradável, pois apanhei uma doce e dizem-me que a maior parte das vezes é ácida. Também não gostam dela, os angolanos com quem falei, porque cheira mal. Isso não confirmo porque a minha sinusite filtra algumas fragâncias.
Este fruto amadurece numa árvore alta com copa larga de onde, ocasionalmente cai. Não sei se os colhedores o apanham do chão ou se trepam pelo tronco e ramos. Quem sobe a palmeiras, tem agilidade para todas as outras alturas.

Oshikandela e Omavele







Hummm….Como hei-de descrever o Oshikandela made in Namibia e o Omavele made in Angola. É um lacticínio, similar ao iogurte natural, o primeiro espesso, o segundo mais líquido. Semi-ácido, declinado em várias categorias, das quais a que eu mais gosto é, claro, a Sweet (Doce). A azeda usa-se para misturar no pirão (farinha cozida que acompanha as carnes e os peixes). Há as de sabores a frutos, mas essas ainda não provei.
Uma angolana disse-me que o Omavele, mais líquido, é melhor porque é mais natural, não tem conservantes, é mais fresco e mais puro. E caso passe um pouco do tempo, mas sem inchar o saco, mistura-se leite e fica outra vez bom para nos deliciarmos.
De vez em quando, porque também é forte no trabalho “interno”, lá vou beberricando por gosto, ou para disfarçar as caimbras de alguma fome porque não fiz a alimentação correcta: almoçar antes de sair de casa, por exemplo. Nos dias em que se entra ao início da tarde, também não apetece muito sentar-me à mesa e comer o arroz com feijão, prato mais regular na casa-clausura.
Hoje havia peixe-burro! Mas não estava pronto….ficou para o jantar. De qualquer forma ia saborear aquela posta assada no forno, a que se juntava a couve e o feijão-verde cozido, mais um copo de Diesel (cerveja com coca-cola) e depois só me apeteceria estender-me no sofá.

terça-feira, 4 de novembro de 2008

Bichos, Monstros e Horrores




















À excepção da Barata, perfeitamente reconhecível, algum entomologista me explica que “bichos” são estes que vos mostro? Com o zoom assemelham-se a seres espaciais. De um mundo surreal, com longas antenas e múltiplas patas, asas repentinas, cores refulgentes…a arrepiar-me num nojo, certamente recíproco.
Vivem comigo em casa, no tecto e nas paredes. Dentro e fora. Reconheço o gafanhoto que me fascina, a salamandra que me enternece, o lagarto que me faz rir.
Não consigo fotografar as moscas que me inspiram neuras e instintos assassinos, umas pequeninas e outras cavalares a exibir o seu flamejante verde e o seu rotundo castanho.
Entram pelas janelas abertas porque uma casa sem persianas atabafa com o sol invasor desde a aurora.
Escancaramos as portas e algumas janelas e depois arcamos com as consequências: a de eu dar em serial killer de moscas e mosquitos (pior que o “mata-sete de uma vez”) e chamar um dos homens da casa para dar cabo das baratas. Pois, não temos redes. Pois, detesto baratas mesmo quando elas na agonia se rebolam para cima, estremecendo as tenazes. Por outro lado, fico cheia de pena de as exterminar e custa-me assistir ao sofrimento que causei em cumplicidade. Juro que ouvi uma barata “chorar” e padeci.
As baratas são um animal pré-histórico, o único que resiste a uma bomba atómica, rastejam nos canos, sobretudo os da cozinha e da casa-de-banho, alimentando-se dos nossos restos e das gorduras.
Qualquer desinfestação é complicada, pois apenas se matam os adultos e as crias; permanecem os ninhos…e nascem de novo. O risco: contaminação com febre tifóide uma vez que compartilham com os ratos o mesmo meio-ambiente.
Matar qualquer ser vivo dá mau karma. Existe mesmo uma seita indiana cujos membros se movimentam vagarosamente, numa lentidão exasperante para não pisar nem sequer uma formiga.
Então deixem as moscas pousar incessantemente nos braços, nos cabelos, nas orelhas, nos olhos, nas narinas, no pescoço, nas costas, nas pernas, por baixo da roupa….deixem também os mosquitos picar-nos à vontade e as baratas morder-nos. Extremamente desagradável sobretudo quando queremos concentrar-nos num trabalho e dormir a sono solto e não desejamos adoecer, por exemplo com o famigerado paludismo! Cansa, exaspera…
Agora compreendo porque é que uma amiga da minha avó materna, quando vivia em Moçambique, engoliu sem querer uma mosca. Se não estivermos atentos…São tantas e muito agressivas!
Depois da chuva abunda a vida desta fauna com novos rastejantes e voadores e saltitões.
A minha colcha branca, à noite, fica preta dos mosquitos pequeninos que caiem, fora outros insectos turbulentos, nomeadamente os carochos, as borboletas de traça, as libélulas e os de estado híbrido como as formigas com asas. O meu sentido do tacto está apuradíssimo e mesmo quando é apenas um fio de cabelo a tanger a minha pele eu agito-me toda para impedir a suculência de algum irritante monstro.

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

Receitas não angolanas: Caçarola de Atum







Ontem cozinhei uma refeição pela primeira vez aqui. Já tinha preparado sobremesas, mas nunca um almoço. Mas apeteceu-me descontrair e criar. Cogitei fazer a Caçarola de Atum. Leva massa de cotovelo, atum de lata, azeitonas pretas, pimento, sopa de cogumelos em pó. Substitui pela sopa de cebola em pó, pois não encontrei a citada. Gostei mais, para mim ficou mais apaladado. Leva ainda cebolas, alho que refoguei com o pimento e as azeitonas descaroçadas. Para a sopa (pus 2 pacotes), junta-se leite e querendo também água. Tem que ficar grossinha. Junta-se este molho ao refogado. Coze-se a massa. Envolve-se tudo.
Vai ao forno polvilhada ou com batata frita esmigalhada de pacote ou pão ralado, por uns minutos.
O que nós não contávamos é que um dos pirexes se partisse com estrondo mal se tirou do aconchegamento. Não era pirex, mas foi vendido como tal. Não aproveitámos nada por causa dos vidros. Ninguém aqui em casa sofre de Pica.
Só nos tentamos com guloseimas.
Acompanhamento: salada de tomate e cebola, cuja terrina foi esfregada com alho, temperada com sal, azeite e vinagre. Beterraba crua temperada do mesmo modo.
Sobremesa: mousse de abacate, com pouco açúcar e ligada com nata fresca; salada de morangos, abacaxi e bananas, aqueles provenientes da Huíla e já docinhos.
Como sempre: cerveja Ngola ou Cuca, que alguns como eu misturam com gasosa Blue, tudo made in Angola.